Capitulo 1
Linhas tortas
25 anos se passaram, e
Marrie estava decidida. As duvidas e acontecimentos em sua vida precisavam de
explicação, e ela perdeu tempo de mais tentando esquecer.
A gente desiste de muito
por pessoas que não dariam um segundo por nós. - Pensou.
As fotos na parede, aquele
abajur, aquela casa, era demais para ela agora, e ela sabia que teria que
deixar tudo para traz. Pegou a mala, uma foto de Joana já envelhecida, era a
única lembrança de sua irmã, a foto foi tirada quando ela tinha apenas 3 anos,
dois anos antes de seu desaparecimento junto à mãe. Mas era essa uma das
histórias que ela não queria se lembrar agora.
Jogou a foto de Victor na
lareira, e desejou do fundo do coração com que as lembranças e os anos ao lado
dele fossem apagados com as chamas. Se lembrou das brigas, e teve saudades da
filha que perdera no divórcio e que hoje completaria 5 anos de idade, se o
acidente não tivesse vindo.
Sua linha de raciocínio
foi interrompida com a buzina do táxi que a esperava, de uma vez por todas, ela
mudaria seu rumo, ela buscaria respostas.
Algumas horas se passaram
quando o avião pousou em Londres, Marrie desceu cabisbaixa, quando sentiu a
neve tocar sua pele. O frio era intenso naquela tarde de inverno, comprou um
café e chamou um táxi. Mostrou a ele o envelope da carta onde continha um
endereço...
"Querida Marrie, sei
que faz tempo, e que muitas coisas mudaram sua vida, mas acho que você deveria
saber da verdade, venha até mim, estou com saudades, quero te explicar o porque
nunca tive a chance de te ver.”
Beijos Papai."
Ao chegar no endereço do
envelope, Marrie foi surpreendida com uma velha sapataria. Bateu mas não obteve
respostas, a mulher ao lado que varria a calçada disse a ela que o dono da
sapataria havia morrido ha algum tempo, mas que parecia que o homem deixara um
filho, ela deu a Marrie um papel com o endereço da família de Joseph, o dono da
sapataria.
Marrie deixou pensativa a
antiga loja, pelo caminho leu e releu aquela carta, e se perguntou se seu pai
sabia que iria morrer quando lhe enviou, ou se o seu ultimo desejo foi conhecer
a filha, um vazio tomou o estomago ao pensar que a culpa de nunca conhecer seu
pai era dela, se arrependeu amargamente por não ter vindo antes, por ter tido
medo de saber das respostas.
Abriu a porta do quarto de
hotel, jogou as melas em um canto, tirou os casacos, respirou fundo e com o
olhar turvo pelas lágrimas colocou o papel com o endereço da escrivaninha ao
lado da cama onde se deitou, sentia sua cabeça pesar dez quilos a mais, era
para aquela viagem ser um sonho realizado, conhecer o pai era uma ideia de um
novo recomeço, mas agora tudo estava perdido novamente, ela sabia que poderia
ter um irmão, que o pai poderia ter se casado novamente, mas nada iria tirar a dor
que estava em seu peito agora.
Marrie tomou um banho para
se recuperar, ela não tinha ninguém para confortá-la agora, mas ela já sabia
como era ter essa dor em seu peito, mas não dá para se acostumar com a dor da
perda, mesmo que o tempo passe, ela sempre estará presente, não importa o que
você faça, esse vazio vai te acompanhar pelo resto de sua vida, como uma
sentença, como uma sombra.
Deitou a cabeça no
travesseiro, já era tarde, ela não sentia fome e nem sono, mas estava exausta,
havia sido um dia cheio e seu corpo doía dos pés a cabeça, o que fez com que
Marrie adormecesse rápido, em um sono envolvente e repousante.
Capitulo 2
Esperança
Marrie abriu os olhos de
vagar, demorou um pouco para se lembrar onde estava, e quando se lembrou a dor
tomou novamente seu peito, fechou os olhos e respirou fundo, ela já havia
passado por isso tantas vezes, ela sabia que não seria fácil, mas mesmo assim
levantou-se, tomou um banho, fez um chá e sentou na varanda do seu quarto de
hotel. O dia estava nublado e chuvoso, o vento frio fez com que sua pele se
arrepiasse, o barulho das árvores fez com que ela viajasse, para um passado
distante, para sua lua de meu com Victor, ela lembrou do quão doce ele era, e o
como ele a fazia rir com suas piadas bobas.
_Somos idiotas quando
amamos cegos e idiotas – pensou.
O chá acabou, e no caminho
até a pequena cozinha ela esbarrou com o pedaço de papel, com o endereço da
família de seu pai. Vestiu um leve vestido azul com flores brancas e colocou
seu sobretudo bege, pegou um velho guarda chuvas e saiu.
Ao chegar no endereço, uma
casa branca, portas e janelas de madeira, respirou fundo e tocou a
campainha.
_Não quero nada, vá em
borá! – respondeu grosseiramente uma mulher alta e magra, os cabelos tingidos
de vermelho e rugas salientes próximas aos olhos.
_Não sou vendedora, vim
buscar informações sobre meu pai. – Respondeu rapidamente Marrie.
_Então minha queridinha,
acho que você errou de casa, não mora nenhum homem nessa casa, somente eu! –
Disse a mulher sem muita paciência.
_Por favor, preciso de
alguma informação, meu pai era dono da antiga loja na avenida principal, ou até
onde eu sei, não sei mais nada sobre ele.
_Você está dizendo que é
filha do Leonard? – Disse a mulher com outra expressão na face.
_Bem eu não sei, só sei
que ele me enviou uma pequena carta, com o endereço da loja. – Disse Marrie,
tentando explicar
_Entendo, queira entrar
minha criança, temos muito para conversar.
Marrie entrou na casa, o
lugar tinha cheiro de velho, os móveis eram rústicos e a decoração não muito
agradável, cheirava a cigarro.
_Sente-se minha criança.
Quer um cigarro? – Disse a mulher estendendo a Marrie o maço.
_Não, obrigada, eu não
fumo! – Respondeu Marrie enquanto se sentava em um sofá de couro velho.
_Qual o seu nome minha
querida? – Perguntou a mulher enquanto acendia um cigarro.
_Me chama Marrie, e a
senhora?
_Sou Marcelia, meu marido
e seu pai eram amigos, os dois eram donos daquela velha loja, até meu marido
falecer, então Leonard ficou com a loja.
_Sabe se meu pai está
bem?
_A tempos eu não tenho
noticias dele, mas tenho em algum lugar o endereço de seu pai. Quando o
encontrar eu lhe entrego. Mas me diga mais sobre você minha criança.– Disse
Marcelia revirando uma caixa na escrivaninha.
Marrie sentiu a dor partir
de seu peito, deixando o ato de respirar mais fácil.
_Bem... Minha mãe e minha
irmã desapareceram quando eu tinha apenas 5 anos, fui criada com minha avó,
depois da morte dela fui casada por mais ou menos dois anos, tive uma filha,
mas meu casamento não deu certo e após o divórcio meu ex marido e minha filha
morreram em um acidente de carro, e agora estou a procura de meu pai.
Após ouvir aquelas
palavras a mulher mudou radicalmente de expressão, ficou pasma, e por um
instante Marrie achou ter visto lágrimas em seus olhos.
Após respirar fundo
Marcelia deu um ultimo trago e disse _ Pode me dar seu endereço, assim que
encontrar o papel vou lhe entregar.
_Claro, por favor, assim
que encontrar me passe o endereço de meu pai?! – Disse Marrie entregando a
Marcelia um papel com o seu endereço.
Marrie saiu daquela casa
mais aliviada, com esperanças de encontrar seu pai, e podendo agora apreciar a
aquelas lindas paisagens.
Ela então decide andar
pela cidade, mas não os pontos turísticos como todos costumam ir, ela queria
apenas andar por ai e sentir como se não tivesse uma bagagem pesada de um
passado conturbado para carregar sempre aonde fosse.
Estar com Clara agora, era
o que ela mais desejava, ver os olhos da filha brilharem ao deslumbrar a beleza
de Londres naquele Outono chuvoso, onde as folhas das arvores caíam com o vento
e as calçadas quase sempre tinham poças d’agua que refletiam o cinza do céu.
Lembrou-se de quando era
apenas uma criança, todos os dias a avó a levava para passear em uma praça onde
havia um lago, mas o que ela mais gostava era dos dias chuvosos, que para ela
eram os melhores. Amava vestir seus casacos e suas galochas e pular em poças
d’agua para ver molhar o que havia ao redor.
Ao passar por uma rua
repleta de prédios altos, Marrie decidiu parar para tomar um chá, ela
concordava que para dias como aqueles, uma bebida quente era o melhor
complemento.
A cidade era linda, e
Marrie se via agora olhando para o famoso relógio de Big Ben; ela havia pensado
em evitar multidões, mas foi atraída pela beleza do lugar, o sol que estava se
pondo refletia na ponta da torre, mas o mais lindo foi ver o alaranjado do céu
que a pouco tinha se aberto para mostrar seu espetáculo final, refletido na água
do rio que cortava a cidade.
Estava tão distraída com
aquele espetáculo que só percebeu o que fizera quando sentiu o quente do chá
escorrer pelas suas mãos e casaco, então percebeu que havia esbarrado em um
homem que olhava para ela esperando alguma reação.
_Meu Deus! Onde estou com
a cabeça? Desculpe-me moço. – Disse Marrie enquanto tentava limpar um pouco do
chá que derramara na jaqueta daquele desconhecido.
_Ah... tudo bem, acontece
direto comigo. – disse o homem com um sorrisinho sem graça. – Sou Pietro, e
você não deve ser daqui não é mesmo?
_Como sabe? Tenho cara de
turista?
_Na verdade tem sim, mas é
mais pelo fato de que normalmente quem não está acostumado com tanta beleza
desse lugar, as vezes acaba esbarrando sem querer em alguém pela rua. – falou
Pietro com um tom cômico.
_Me desculpe, nem me
apresentei. Sou Marrie de Nova York. – Marrie sorriu enquanto estendia a mão
para cumprimentar Pietro.
_Então Marrie de Nova
York, aceita sair hoje á noite para conhecer gente nova? Acho que vai te fazer
bem!
Marrie olhou para baixo e
pensou por um segundo. Estivera tão envolvida em achar respostas que nem se
preocupou em ter uma vida social.
Ergueu a cabeça e com um
sorriso e cerrar de olhos disse sim a Pietro, que em seguida entregou um cartão
de um bar.
– Te vejo lá, Marrie de
Nova York. E saiu andando pelas ruas com as roupas manchadas de chá.
Marrie percebeu que havia
um sorriso bobo em seu rosto, que a acompanhou a conversa toda. Era estranho
saber que a mulher retraída e envergonhada que sempre fora, agora iria sair com
um cara que conhecera a três minutos atrás, se sentiu feliz por ter algum
programa para a noite, pegou um taxi e voltou para o hotel.
Capitulo
3
Não
fale com estranhos!
Já eram quase nove horas quando Marrie ouviu a buzina do
taxi lá fora, se olhou no espelho mais uma vez, seus olhos se destacavam
perante toda composição de tons de preto do vestido e prata das joias, usava um
colar de prata com uma pequena esmeralda no pingente, o mesmo ela havia ganhado
da avó quando completou 15 anos de idade, e guardava com amor desde então. Seus
sapatos também pretos em tom fosco com um pequeno salto, dava a ela uma linda
postura. Pegou sua bolsa que estava jogada na cama e saiu, sem imaginar como
seria seu retorno.
Ao chegar no endereço, parecia um lugar legal com uma
decoração moderna, na parte da frente uma placa neon com um nome em destaque,
South. Ao entrar percebeu que haviam várias pessoas rindo alto e bebendo, ela
não saberia dizer de quem era a musica que tocava pois era acostumada a ouvir
musica clássica e as vezes uns blues.
Quando olhou para uma mesa repleta de gente, reconheceu
Pietro, agora com uma outra jaqueta, dessa vez de couro. Pietro era um homem
alto com a barba por fazer, tinha olhos castanhos e usava óculos de grau, algo
que Marrie não havia percebido da primeira vez.
Ele então notou que Marrie havia chegado, foi em direção
a ela com um copo de cerveja na mão.
_ Você veio, Marrie de Nova York. –Disse ele cumprimentando-a com um beijo no
rosto.
_Bem, achei que você tinha razão, eu realmente precisava
conhecer gente nova.
Ele a levou a mesa aonde estava quando ela entrou.
_Pessoal essa é Marrie de Nova York, ela é nova por aqui
então deem boas vindas a ela.
Enquanto Pietro apresentava cada um que estava naquela
mesa, Marrie se sentia mais tranquila ao saber que não era a única mulher no
grupo e que eles não iam exclui-la da conversa.
Uma hora e três copos de cerveja depois, Marrie se sentia
uma adolescente novamente. Se contassem a ela de manhã que naquela noite ela
estaria em uma mesa rodeada de pessoas que não conhecia conversando
tranquilamente com eles, ela jamais acreditaria.
_Então Marrie, fale mais sobre você. – Falou Elena, uma
mulher alta, cabelos tingidos de vermelho, usava uma blusa de mangas
transparentes onde dava para notar seu braço repletos de tatuagens.
_Bem, não tenho uma vida tão interessante para entreter vocês,
mas já fiz faculdade de enfermagem, meu sonho era ser médica futuramente.
_E por que não seguiu carreira? – Indagou Pietro.
_Fiquei grávida no ultimo ano de faculdade, e quando era
para segurar o diploma, eu segurava minha filha nos braços.
_Você não tinha dito que era mãe, onde está sua filha
agora? –Perguntou Elena depois de beber mais um gole de cerveja.
Marrie sentiu uma dor no peito, não queria lembrar de
tudo novamente, ela estava lá para esquecer, mas parecia que não importava o
quanto ela tentasse, aquela era a cruz que ela teria de carregar.
_Ela morreu em um acidente de carro, junto com meu ex-marido.
Por um segundo a mesa fez silêncio.
_Sinto muito Marrie! – Foi tudo o que Pietro conseguiu
dizer.
Era por volta das duas da manhã quando Marrie chegou no
hotel, havia pegado carona com Pietro. Ela sentia a cabeça girar, não era
acostumada a beber tanto quanto bebeu aquela noite, não conseguia ao menos
pensar direito, se sentia muito zonza para isso.
_Venha vou te levar para seu quarto, lembra o numero? –
Perguntou Pietro enquanto segurava Marrie pela cintura.
_Está no cartão, dentro do bolso do casaco.
Eles entraram no elevador e Pietro colocou a mão em seu
casaco para pegar o cartão do quarto.
_Pronto! Quarto 37 –Pietro abriu a porta e ajudou Marrie
a entrar.
Ao fechar a porta, Marrie se virou e colocou a bolsa na
mesa ao lado da cama onde havia um vaso de flor e um livro que Marrie veio
lendo no avião. Ela se sentou na cama e passou a mão no rosto esperando que
isso ajudasse a se sentir melhor.
_Bem, obrigada pela noite! Nós poderíamos sair mais
vezes, seus amigos são bem legais e eu me diverti muito essa... Suas palavras
foram interrompidas quando Pietro colocou a mão em seu pescoço e a beijou.
_Pare! Eu não quero nada disso! –Disse Marrie enquanto
tentava tirar a mão de Pietro que deslizava pelo seu corpo.
_Seja mais maleável querida, não foi você que disse que
estava aqui para esquecer o passado? Ótima forma de recomeçar aproveitando a
vida, relaxa! –Pietro tentava tirar seu vestido quando Marrie deu um tapa em
seu rosto.
_Saia de cima de mim! Já disse que não quero nada!
_Achou mesmo que iria sair comigo e não pagaria um preço
por isso, fiz você se divertir essa noite, agora vai ter que retribuir o favor!
Pietro segurou os braços de Marrie enquanto arrancava seu
vestido e a beijava a força. Ela se debatia e tentava livrar seus braços
enquanto tentava gritar e Pietro colocou a mão em sua boca quando Marrie soltou
um de seus braço, pegou o vaso de flor da escrivaninha e quebrou-o no rosto de
Pietro. Os cacos se espalharam pelo quarto, do rosto de Pietro começou a
escorrer sangue.
_Sua prostituta barata isso não vai ficar assim! Vou
cobrar o dobro daquela ordinária por ter me mandado aqui com você.
Pietro saiu correndo com a mão no rosto tentando estancar
o sangramento. Marrie não entendeu o que ele quis dizer com aquelas palavras,
como alguém poderia ter planejado tudo aquilo?
Ela sentiu a cabeça pesar e em questão de segundos estava
completamente apagada em sua cama.